Francês Bourbon (1800-1890) fez um brilhante trabalho de análise do conteúdo do livro de Êxodo da Bíblia, de uma maneira científica, rigorosa, não é minha intenção fazer uma análise tão precisa, pretendo apenas realizar uma reflexão do conteúdo de uma passagem do Antigo Testamento que se encontra em 2 Reis 6: 24-33 e 7: 20.
Na referida passagem, conta-se que houve uma grande fome na cidade de Samaria, devido ao cerco ocasionado pelo exército do rei Ben-Hadade da Síria. Reza Flávio Josefo, famoso historiador, que naquela circunstância, se vendiam uma caneca de esterco de pombo como farinha para servir de alimentação humana. Ele conta ainda que no contexto do cerco, chegou ao ponto de mães praticarem o canibalismo contra os próprios filhos. Caro amigo, imagine que situação caótica?
Nesse ínterim, entra cena o profeta Elizeu, que anteriormente previu sete anos de fome para a referida cidade e agora ele volta em cena, e traz uma mensagem de esperança dizendo que a fome iria acabar, e que tal fato já seria no dia seguinte, segundo uma revelação divina.
Então o profeta avisou primeiro sobre profecia ao capitão do rei, porém, o militar cético escaneou do profeta. Destarte Elizeu disse para oficial que ele iria apenas contemplar o fim do cerco, porém não iria desfrutar dos bônus do acontecimento.
Enquanto isso, próximo da cidade sitiada, havia quatro leprosos que viviam isolados por causa da enfermidade. Eles estavam reunidos refletindo sobre a situação miserável que se encontravam, ou seja, uma pequena terapia de grupo. Brincadeiras à parte (rs), o quarteto buscava uma alternativa para não morrerem de fome. Depois de conversar bastante, eles chegaram a seguinte conclusão: se ficassem, iriam morrer de fome e se fossem buscar ajuda com os siros, povo conhecido pela crueldade que tratavam seus inimigos, poderiam também ser mortos. Era tipo o que diz um famoso ditado popular: “se ficar o bicho pega se correr o bicho come”.
Então eles, criaram coragem, e resolveram ir até a cidade do inimigo pedir comida. Então partiram. E sabe o que aconteceu? Chegando lá, os leprosos encontraram a cidade deserta e tudo abandonado. Como assim?
É que aconteceu o inesperado. O Senhor Deus fez com que os siros ouvissem ruídos de grandes exércitos e por esta razão eles pensaram que estavam sendo invadidos. O povo da Síria, com muito medo, fugiu, deixando bens, alimentos, animais, ou seja, tudo o que eles possuíam ficaram para trás.
Diante dos despojos, os leprosos puderam saciar sua fome, comendo e bebendo fartamente. Entretanto, a coisa mais altruísta da história acontece, eles lembraram das pessoas que estavam morrendo de fome na cidade de Samaria e resolveram levar as boas novas aos porteiros de Samaria, e estes imediatamente fizeram a mensagem chegar aos ouvidos do rei.
O soberano aconselhado por seus serviçais, mandou averiguar a informação e após a confirmação do ensejo, mandou avisar o povo, que imediatamente saíram em direção ao arraial dos siros.
No meio da euforia, o povo acaba pisoteando aquele oficial que duvidou do homem de Deus. E aconteceu como o profeta havia dito, naquele dia realmente a fome iria acabar em Samaria e que aquele homem incrédulo não iria participar.
Para nossa reflexão, nesta história destaco os seguintes personagens: o profeta, o capitão, os porteiros, o serviçal, o rei e os quatro leprosos.
- O profeta, homem de Deus, que traz uma resposta de Deus de esperança para uma grave crise e situação.
- O capitão que recebeu uma informação privilegiada da parte de Deus, mas duvidou e até debochou do profeta, bem como omitiu a boa notícia ao rei. Como consequência, ele foi morto pelo povo como previu o profeta.
- Os porteiros, que pertenciam ao baixo escalão do reino, ouvindo a mensagem dos leprosos, logo fizeram de maneira eficiente chegar ao rei à notícia sobre o arraial dos siros. Da mesma forma o serviçal real que deu um bom conselho ao soberano para averiguar se a informação era verdadeira mediante o receio de ser uma armadilha do inimigo.
- O rei que soube ouviu conselhos para tomar uma atitude de liderança.
- Os quatro leprosos, que eram excluídos da sociedade, foram os protagonistas que puderam ajudar toda uma cidade. Não foram egoístas, não foram individualistas.
Fazendo uma comparação desta passagem bíblica com o contexto atual, indago o seguinte: - Quem somos nós no meio dessa pandemia do Coronavírus?
Somos como o profeta que leva a palavra de Deus? Estamos levando uma mensagem de esperança para as pessoas. A bíblia diz em Provérbios 11:25b que, “quem dá alívio aos outros, alívio receberá”. Às vezes pode ser apenas uma simples palavra, um telefone, você pode mudar a vida de alguém.
Ou somos os leprosos? Estamos dividindo o pouco ou o muito com os que precisavam. Há pessoas as quais acham que quando tiverem bastante dinheiro poderão ajudar alguém, e acabam no final, não fazendo nada. Os leprosos, pelo contrário, tiveram a atitude de ajudar e conseguiram salvar uma cidade inteira.
Talvez sejamos como os porteiros? Estamos sendo eficientes, pró ativos em fazer o bem e realizar o que precisa ser feito, ou seja, missão dada, missão cumprida.
Ou somos o serviçal real que deu um bom conselho ao rei para verificar se a informação trazida pelos leprosos procedia. Pessoas que ocupam cargos significativos, que precisa de ser bons conselheiros, que as pessoas tenham coragem de expressar seus conselhos e opiniões. Atribui-se a Martin Luther King uma frase de valor inquestionável: “O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons”.
Não podemos ser como o capitão que não fez nada para ajudar, além de duvidar da palavra de Deus, e ainda ficou na porta atrapalhando o povo na buscar da solução e por consequência teve um fim trágico, morrendo pisoteado na porta da cidade.
Nesta pandemia pudemos assistir inúmeros casos de solidariedade entre as pessoas. Pessoas que saem do conforto de suas casas para distribuir cestas básicas, outras ousam alegrar seus vizinhos cantando ou tocando instrumentos musicais, enfim, são inúmeros exemplos de pessoas realizando o amor ao próximo ao redor do mundo. Lembro e ressalto também os profissionais da saúde, os atendentes nos hospitais, os motoristas das ambulâncias e demais profissionais, que estão na linha de frente, na batalha contra esta pandemia, que estão lutando bravamente para salva vidas, cumprindo fielmente sua missão.
Mas qual o meu objetivo, aonde eu quero realmente chegar? Diante do que estamos vivenciando nesses tempos, parei para pensar, se um dia haverá uma Accountabillity Divina? Mas o que significa esse termo estranho?
Accountability é uma dessas palavras inglesas que exige uma frase inteira na nossa língua para ser traduzida, como citou João Cordeiro em seu livro sobre o assunto. O termo Accountability tem algumas traduções para o português, porém sempre remetendo para a questão da responsabilização por atos praticados. Então, depois dessa simples explicação, será que um dia seremos responsabilizados ou recompensados por nossos atos durante essa pandemia.
Enfim, o coronavírus assim como a fome de Samaria passará, mas que tudo isso possa trazer um aprendizado e um legado para todos nós. I believe and you?