quinta-feira, 27 de abril de 2017

A Baleia azul e os nossos adolescentes: considerações aos pais e professores Adriana de Melo Ramos

A Baleia azul e os nossos adolescentes: considerações aos pais e professores
Adriana de Melo Ramos 
Danila Di Pietro Zambianco 
Lívia Mª Ferreira da Silva 
Soraia S. Campos 
Thais C. L. Bozza[1] 
 
Nos últimos dias o GEPEM (Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral - UNESP/UNICAMP – SP) recebeu inúmeras mensagens de professores, gestores e pais, preocupados com a repercussão de um jogo chamado “Baleia Azul” (Blue Whale). O jogo, que viralizou nas redes sociais e na mídia nas últimas semanas, propõe 50 desafios macabros aos adolescentes, que vão desde tirar fotos assistindo a filmes de terror, automutilar-se, fotografar-se em lugares perigosos até, na etapa final, cometer suicídio. Nas últimas semanas, só no YouTube, são milhares de vídeos sobre o jogo. Há links de convites para as pessoas entrarem em dezenas de grupos fechados sobre o assunto, no WhatsApp e no Facebook, em vários idiomas, inclusive português. O que se sabe é que o jogo Baleia Azul teve origem nas redes sociais da Rússia, espalhou-se pelo mundo, chegando ao Brasil causando bastante transtorno.
 
Alguns atribuem a grande repercussão do jogo ao momento em que uma série produzida e exibida pelo Netflix também viralizou entre os jovens, se trata da série 13 Reasons Why (“Os 13 porquês”) que retrata os momentos finais de uma jovem suicida. A diferença é que enquanto a série foi produzida com o apoio de especialistas para tratar de um assunto sensível, e o faz por meio de uma representação simbólica, afinal é um vídeo; o jogo estimula os seus participantes a agirem contra si próprios e tem em seus criadores pessoas anônimas e mal-intencionadas.
 
O desafio da Baleia Azul não é o primeiro jogo com apelos letais que virou moda entre os adolescentes. Tivemos anteriormente no Brasil, o Jogo da Asfixia, o Desafio do Sal e do Gelo, assim como o Jogo da Fada. Todos eles estimulavam a tortura e o autoflagelo em quem participasse da trama.
 
O fato que tem chamado a atenção de todos é a associação de alguns suicídios entre os adolescentes ao desafio da Baleia Azul, porém, até o momento, não há dados oficiais que relacionem diretamente mortes ao jogo. Entretanto, o assunto reacendeu o debate sobre a depressão infanto-juvenil e sobre o suicídio entre os jovens, que vem aumentando seu percentual muito antes do jogo ficar “famoso”. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a depressão é a principal causa de doença e invalidez entre os adolescentes; enquanto que a morte por armas, acidentes de trânsito e suicídio estão entre as três principais causas de morte para essa faixa etária. 
 
Mas antes de sairmos procurando culpados para o problema, cabe perguntar-nos: por que adolescentes ficariam vulneráveis a esse tipo de “jogo” ou “desafio”?
 
É sabido que uma das características comuns dos adolescentes é a necessidade de pertencimento a grupos ou “tribos”. Nessa fase da vida, o grupo de pares assume uma importância desmedida, distanciando-se inclusive do contexto familiar. O grupo passa a atuar como regulador dos comportamentos, levando seus membros a acatar certas normas e regras que conduzem suas ações. E mais, os grupos aos quais os jovens pertencem desempenham um papel importante na construção de sua identidade, no que diz respeito às ideologias e sistemas de valores. Ou seja, precisa do outro para entender a si próprio, para construir-se. A estética e a aparência emergem nesse contexto. O tipo de roupa, o corte de cabelo, os acessórios utilizados são importantes para a manutenção do sentimento de pertença a um determinado grupo. Ao adotar estilo característico, o jovem acredita se distinguir dos adultos e de outras tribos, esperando assim, ser reconhecido e aceito entre os iguais. Alguns estudiosos apontam para uma crise de identidade na adolescência que desencadeia o processo de identificações com pessoas, grupos e ideologias, sendo essas identidades provisórias até que a crise em questão seja resolvida e uma identidade própria, construída. O dilema adolescente: “ser adulto e ainda não ser adulto” em um momento de transformação corporal, escolha profissional, diante da descoberta da sexualidade, tendo acesso às drogas lícitas e ilícitas, certamente é um malabarismo de difícil equilíbrio. 
 
Muitas vezes quando não encontram um grupo que lhes acolha e que queira pertencer, ou que as pressões dessa fase da vida se sobreponham às coisas boas, os adolescentes tendem a enxergar com dificuldade qual o sentido da vida. Uma vida sem sentido é, portanto, uma vida pouco significativa. A falta de sentido na vida para o jovem pode ser motivo de não mais querer viver. O número de suicídios em jovens está aumentando em todo o mundo e, na maioria dos casos, havia algum tipo de transtorno mental, principalmente a depressão. O suicídio possui causas psicopatológicas, mas também sociais. Para alguns indivíduos a não integração à vida social, a grupos, podem pressionar de tal forma que a depressão e a melancolia tomam conta do sujeito, enxergando como a única solução para o fim do sofrimento, dar cabo à própria vida.
 
O “jogo” Baleia Azul é apenas o pano de fundo para um cenário que revela o aumento dos casos de suicídio entre jovens que se repete há anos. Como já citado, jogos letais anteriores a esse existiram e outros posteriores, certamente existirão. Não devemos ignorar a existência destes jogos, mas sim considerar a questão proposta para reflexão e lançar mão de ações que possam auxiliar nossos jovens a enfrentarem com assertividade os desafios e perigos a que eles podem estar expostos. Os adultos estão assustados e preocupados, pois encontram dificuldade de entrar no universo dos adolescentes, de se conectar, de estabelecer um diálogo assertivo e de perceber quando algo não está indo bem. Não se deve banalizar ou julgar essa realidade, com a crença de que estão querendo, apenas, chamar a atenção. É importante refletir sobre a depressão, suas causas e consequências, considerando esta uma doença, tratável. É importante um olhar atento ao perceber sinais de mudança de comportamento dos adolescentes e buscar estratégias de intervenção.
 
Instituições, como família e a escola, precisam estar atentas a algumas mudanças comportamentais, tais como[2]:    alterações significativas na personalidade e ou nos hábitos;
 comportamento ansioso, deprimido ou agitado;  queda no rendimento escolar;  perda ou ganho repentino de peso;  mudança no padrão de sono;
 tristeza, irritação e acessos de raiva combinados;  comentários autodepreciativos ou desesperançosos em relação ao futuro;  demonstração clara ou velada do desejo de pôr fim à vida;  desinteresse em realizar atividades que demonstrava prazer anteriormente; 
 vestir roupas que cubram o corpo, mesmo em dias quentes, na tentativa de esconder cortes e
machucados.
 
O principal canal de comunicação com os jovens deve ser o diálogo, a fim de conscientizá-los a respeito das consequências de que essas práticas nada têm de brincadeira, ou tampouco podem ser chamadas de inocentes. Colocar-se à disposição para acolher e escutar, sem julgar, considerando o que pensam e sentem é sem dúvida o caminho recomendável. O controle e monitoramento por parte dos pais, assim como a proibição de acesso a Internet, é uma missão, perdida com os jovens, ainda mais considerando que o acesso à internet é na maior parte das vezes por meio de dispositivos móveis. É importante estabelecer conversas abertas e honestas sobre os sentimentos dos jovens, dúvidas, angústias, desejos, frustrações. E, frente aos sinais de sofrimento prolongado, isolamento e frases sobre suicídio ou desespero (dizendo que não tem motivo para continuar vivo, que não fará falta se morrer...), é importante buscar auxílio de profissionais que possam realizar orientação adequada sobre o tratamento.
 
É importante que a escola, além de se valer das mesmas recomendações dadas à família, abra em seu currículo espaços sistemáticos para a reflexão da convivência e dos valores, como a valorização da vida. Como instituição que visa educar os alunos para uma sociedade cada vez mais complexa, é válido incluir temáticas relevantes aos jovens que aparecem na internet e nas redes sociais, problematizando-as e promovendo reflexão crítica. 
 
Educar em tempos pós-modernos, com tantas mudanças e problemas complexos, é realmente desafiador. Cada dispositivo móvel ou computador com acesso à internet é uma janela para o mundo, com interações positivas e outras, perigosas. Mas se pretendemos formar jovens para a autonomia moral e intelectual, além de construir relações de respeito mútuo e confiança, incentivar ações de cuidado e generosidade, espaços para a fala e a escuta como rodas de diálogo e mediação de conflitos, precisamos cada vez mais nos preparar e incorporar temáticas que estão presentes no universo online, como por exemplo, os processos de manipulação e sedução ou as agressões virtuais. Essa tarefa, responsabilidade de todos, é urgente e necessária.
 
Quer saber mais? Acesse um vídeo e reportagens que abordam o tema de forma clara e didática:
https://www.youtube.com/watch?v=qKQQKWwKLTo  https://www.facebook.com/SafernetBR/posts/1317178101663414  https://gestaoescolar.org.br/conteudo/1790/jogo-baleia-azul-o-que-a-escola-pode-fazer
 
 
  
 
 
 


[1] Integrantes do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral-UNESP/UNICAMP. Para mais informações acesse: www.gepem.org.
[2] Adaptado de: http://www.fatosdesconhecidos.com.br/o-que-e-o-jogo-da-baleia-azul-que-esta-rodando-internet-e-o-que-ele-esta-fazendo-compessoas/ 

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